Depois do clique, o negativo ou o cartão de memória guardam algo precioso que pode constituir um bem a
preservar especialmente, embora as imagens apenas gozem de protecção após a sua exteriorização(revelação, impressão ou outra): só após esta fase a lei confere protecção à fotografia independentemente da sua divulgação, publicação, utilização ou exploração. É por isso que, por exemplo, os laboratórios fotográficos, em geral, apenas se alegam na obrigação de fornecer ao autor/fotógrafo igual quantidade de negativo no caso de o que foi entregue para revelação se perder ou estragar.
Esta ideia decorre logo do previsto no Artigo 1.º (Definição) do Código dos Direitos de Autor (CDA): “Consideram-se obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas, que, como tais, são protegidas nos termos deste Código, incluindo-se nessa protecção os direitos dos respectivos autores”
Pode entender-se então que se uma obra não chegou a ser “exteriorizada” (no caso, revelada), não pode gozar de protecção. O que não significa que não haja direito a indemnização, mas isso é outra questão: trata-se de danos morais ou materiais comprováveis.
A este respeito, vejamos o Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, que regula as chamadas “Cláusulas
Contratuais Gerais”. O artigo 18.º diz:
“São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
a) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por danos causados à vida, à integridade moral ou física, ou à saúde das pessoas;
b) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por danos patrimoniais extracontratuais, causados na esfera da contraparte ou de terceiros;
c) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por não cumprimento definitivo,
mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou de culpa grave;
d) Excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por actos de representantes ou
auxiliares, em caso de dolo ou de culpa grave;
(…)
h) Excluam a faculdade de compensação, quando admitida na lei;
Assim, se um laboratório alega que apenas pode devolver o filme e isso está traduzido em contracto (por exemplo nas saquetas do laboratório), sendo isso contrário ao referido diploma, não tem sustentação. Isto não quer dizer que não avancem logo com a ideia de que apenas podem substituir o negativo usado por igual metragem de filme.
Passemos à obrigação de indemnizar. Os laboratórios constituem-se na obrigação de indemnizar por danos morais e materiais comprováveis, nos termos gerais do Código Civil. Naturalmente, o problema coloca-se a quanto à prova. Como provar que as imagens (potenciais, ainda não reveladas) contidas no rolo são as da
deslocação ao Pólo Sul e não as do aniversário do animal de estimação? E como provar que, mesmo estas
últimas, não têm um valor inestimável por qualquer motivo razoável?
A este propósito, mais adequado que os tribunais, poderão ser as associações de defesa do consumidor ou os centros de arbitragem de conflitos de consumo, se a situação ocorrer numa área que esteja por estes abrangida.
O direito de autor em geral
O direito de autor abrange os chamados “direitos de carácter patrimonial” e os “direitos de natureza pessoal” ou “direitos morais”. No âmbito dos direitos de carácter patrimonial o fotógrafo tem o direito exclusivo de dispor da sua obra. Independentemente dos direitos patrimoniais, e mesmo depois da transmissão ou extinção destes, o autor goza de direitos morais sobre a sua obra, designadamente o direito de reivindicar a respectiva paternidade e assegurar a sua genuinidade e integridade, opondo-se à sua destruição e, de um modo geral, a todo e qualquer acto que a desvirtue e possa afectar a sua honra e recensuradoção. Este direito é inalienável, irrenunciável e não prescreve.
O direito de autor pertence ao fotógrafo, salvo disposição expressa em contrário e é reconhecido independentemente de registo, depósito ou qualquer outra formalidade. Este pode delegar em associações organismos nacionais ou estrangeiros constituídos para gestão do direito de autor a sua representação perante terceiros.
Em Portugal existe a Sociedade Portuguesa de Autores “associação criada sob a forma de cooperativa com a vocação de satisfazer, sem fins lucrativos, as necessidades culturais, económicas e sociais dos seus membros e administrar em representação destes e bem assim dos seus membros de associações, organismos ou outras entidades estrangeiras, as obras intelectuais de cujos direitos autorais sejam titulares”.
Contudo, e para as obras inéditas, a própria SPA recomenda que os autores ou titulares de direitos autorais procedam também ao seu registo, contactando para o efeitos a Inspecção Geral das Actividades Culturais.
O direito de autor sobre obra fotográfica ou obtida por qualquer processo análogo ao da fotografia, caduca,
na falta de disposição especial, 70 anos após a morte do criador intelectual, mesmo que a obra só tenha sido
publicada ou divulgada postumamente e esta cai no domínio público.
A simples autorização concedida a terceiro para divulgar, publicar, utilizar ou explorar a obra por qualquer
processo não implica transmissão do direito de autor sobre ela. Esta autorização só pode ser concedida por
escrito, presumindo-se que implica uma retribuição e o seu carácter não exclusivo. Da autorização escrita devem constar obrigatória e especificadamente a forma autorizada de divulgação, publicação e utilização,
bem como as respectivas condições de tempo, lugar e preço. A transmissão total e definitiva do conteúdo
patrimonial do direito de autor só pode ser efectuada por escritura pública, com identificação da obra e
indicação do preço respectivo, sob pena de nulidade.
Não são admitidas modificações da obra sem o consentimento do autor, mesmo naqueles casos em que,
sem esse consentimento, a utilização da obra seja lícita, excepto em colectâneas destinadas ao ensino.
É lícita, embora obedecendo a certos requisitos (art. 75.º do CDA), por exemplo:
a) A reprodução, distribuição e disponibilização pública, para fins de ensino e educação, de partes de
uma obra publicada, contanto que se destinem exclusivamente aos objectivos do ensino nesses estabelecimentos e não tenham por objectivo a obtenção de uma vantagem económica ou comercial, directa ou indirecta
b) A inclusão de peças curtas ou fragmentos de obras alheias em obras próprias destinadas ao ensino;
c) A utilização de obra para efeitos de publicidade relacionada com a exibição pública ou venda de obras artísticas, na medida em que tal seja necessário para promover o acontecimento, com exclusão de qualquer outra utilização comercial.
A este respeito, convém ver o art. 76.º, o qual refere as obrigações que limitam esta utilização. A utilização
livre deve ser acompanhada da indicação, sempre que possível, do nome do autor e do editor, do título da
obra e demais circunstâncias que os identifiquem. As obras reproduzidas ou citadas não se devem confundir
com a obra de quem as utilize, nem a reprodução ou citação podem ser tão extensas que prejudiquem o
interesse por aquelas obras.
A protecção da fotográfia
Nesta matéria regulam em especial os artigos 164.º a 168.º do CDA. Para que a fotografia seja protegida é necessário que pela escolha do seu objecto ou pelas condições da sua execução possa considerar-se como criação artística pessoal do fotógrafo. Isto significa que é o olhar do fotógrafo sobre um dado tema que torna o resultado captado único e diferente de quaisquer outros.
O autor da fotografia tem o direito exclusivo de a reproduzir, difundir e pôr à venda. Existem, porém, restrições:
a) Referentes à exposição, reprodução e venda de retratos.
b) Os direitos de autor sobre a obra reproduzida, no que respeita às fotografias de obras de artes figurativas.
Quando publicada, a fotografia deve conter as seguintes indicações:
a) Nome do fotógrafo;
b) Em fotografias de obras de artes figurativas, o nome do autor da obra fotografada.
Se a fotografia for efectuada em execução de um contrato de trabalho ou por encomenda, o direito previsto neste artigo pertence à entidade patronal ou à pessoa que fez a encomenda. Neste caso, deve ser paga ao autor uma remuneração adequada.
A alienação do negativo importa, salvo convenção em contrário, a transmissão dos direitos de autor, excepto, como se referiu atrás, os direitos morais.
Violação e defesa do direito de autor
Comete o crime de usurpação, por exemplo:
a) Quem utilizar uma obra sem autorização do autor;
b) Quem divulgar ou publicar abusivamente uma obra ainda não divulgada nem publicada pelo seu autor ou não destinada a divulgação ou publicação, mesmo que a apresente como sendo do respectivo autor, quer se proponha ou não obter qualquer vantagem económica;
c) Quem, estando autorizado a utilizar uma obra, exceder os limites da autorização concedida.
Porém, existe um facto importante a reter. O autor que, tendo transmitido, total ou parcialmente, os respectivos direitos ou tendo autorizado a utilização da sua obra, também pode ser punido se a utilizar directa ou indirectamente com ofensa dos direitos atribuídos a outrem.
Comete o crime de contrafacção quem utilizar fraudulentamente, como sendo criação ou prestação sua, obra que seja mera reprodução total ou parcial de obra, divulgada ou não divulgada, ou por tal modo semelhante que não tenha individualidade própria.
Não é contrafacção a mera semelhança entre fotografias se, apesar das semelhanças decorrentes da identidade do objecto, cada uma das obras tiver individualidade própria.
Estes crimes podem ser punidos com pena de prisão até três anos e multa de 150 a 250 dias, de acordo com a gravidade da infracção, agravada uma e outra para o dobro em caso de reincidência. A negligência também é punível com multa de 50 a 150 dias.
Constitui violação do direito moral do fotógrafo e pode ser punido no termos atrás descritos:
a) Quem se arrogar a paternidade de uma obra de prestação que sabe não lhe pertencer;
b) Quem atentar contra a genuinidade ou integridade da obra ou prestação, praticando acto que a desvirtue e possa afectar a honra ou recensuradoção do autor ou do artista.
Agora que tem noção da protecção que lhe assiste e dos seus deveres, poderá concentrar-se no que interessa… fotografar muito, de forma única e criativa.
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